A Lei Maria da Penha completou, ontem, doze anos de vigência tendo como foco a defesa das mulheres, sobretudo, as que são vítimas de agressão doméstica. Representantes de entidades feministas ressaltam que, apesar dos avanços, em muitos casos a impunidade continua reinando. A Lei foi sancionada em 2006, constituindo-se no maior registro e na maior arma da luta contra a violência doméstica no país. Após sobreviver a duas batalhas de assassinato, Maria da Penha batalhou judicialmente durante quase 20 anos para que as agressões que sofreu fossem reconhecidas. Conseguiu mais do que imaginava. A criação da Lei, considerada uma das melhores do mundo no combate à violência contra a mulher ajudou milhares de pessoas e ampliou muito a conscientização quanto a relacionamentos abusivos e criminosos.
Maria da Penha Maia Fernandes nasceu em Fortaleza, no Ceará, em uma família de classe média. Ela foi incentivada pela avó, parteira, a estudar Farmácia e assim o fez na Universidade Federal do Ceará. No segundo ano de curso, conheceu um rapaz em uma festa e acabou se casando com ele aos 19 anos, com a garantia de continuidade dos seus estudos após o casamento. O acordo, entretanto, terminou não se materializando conforme o combinado. O marido de Maria da Penha era um homem muito ciumento e a prendia em casa para proibi-la de estudar. Decidida, Maria da Penha partiu para a separação. Ela voltou a estudar e ingressou em um curso de mestrado em parasitologia na Universidade de São Paulo. Foi nesse período, por meio de amigos em comuns, que ela conheceu o segundo marido, o economista e professor universitário colombiano Marco AntonioHerediaViveros. Foram morar juntos em Fortaleza e com o fim da pós-graduação mudaram-se de novo para Fortalezam onde o casal teve três filhos. Descrito como um homem simpático, solícito e prestativo pela própria Maria da Penha, com o seu tempo seu comportamento mudou completamente.
Viveros passou a agredir física e psicologicamente as filhas e aterrorizar a mulher. A farmacêutica tinha medo de se separar e acreditava que a denúncia das agressões não seria levada a sério; na época não havia nenhuma delegacia da mulher. Em 1983, o relacionamento chegou a um momento drástico. Durante a madrugada, Maria da Penha levou um tiro de espingarda nas costas. Foi a primeira tentativa de assassinato pelo marido, que ainda tentou provar a própria inocência colocando uma corda no próprio pescoço e afirmando que assaltantes haviam invadido a casa. Maria da Penha passou por cirurgias em Fortaleza e São Paulo e ficou no hospital durante quatro meses. Saiu paraplégica. De volta à sua casa, sofreu outra tentativa de assassinato do marido ele tentou eletrocutá-la no chuveiro, durante o banho. Na cadeira de rodas, Maria da Penha gritou e foi salva pela babá das crianças. Maria da Penha conseguiu na Justiça uma ordem para poder sair de casa com as três filhas mas a luta para que o ex-marido fosse preso pelo que fez foi longa. Ele só foi a júri em 91 e mesmo condenado a quinze anos de prisão, conseguiu um recurso que anulou o julgamento. Decepcionada com a Justiça brasileira, Maria da Penha escreveu um livro de memórias e apelou para a Justiça Internacional. Pela primeira vez a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA acabou uma denúncia de violência doméstica e Viveros ficou preso durante dois anos, até 2002. A consequência mais importante de tudo pelo que a farmacêutica passou foi a aprovação da Lei que tem o seu nome e só foi criada após o Brasil ser condenado por negligenciar a violência doméstica até então. Maria da Penha continuou engajada no movimento feminista, proferindo palestras e procurando conscientizar e alertar outras mulheres a denunciarem violência.
Nonato Guedes