No Brasil, ninguém fez humor como Paulo Gustavo, que morreu, ontem, aos 42 anos, vítima da covid-19. O ator conquistou o público brasileiro com seus textos e personagens populares, capazes de divertir, e despertar identificação em gente de todo tipo, classe social e ideologia. Com piadas aceleradas e espontâneas, um humor muito físico e frases que todo brasileiro já ouviu no dia a dia, ele brilhou no papel de mulheres cômicas e fez até os surtos de mãe serem pop: todo o mundo ama Dona Hermínia!
Mas a alegria chegou ao fim. Internado desde 13 de março, Paulo Gustavo foi mais uma vítima da covid-19, pouco depois de conquistar o merecido espaço que ainda faltava em sua carreira. Em dezembro de 2020, depois de muitos anos de sucesso no cinema, na TV paga, no teatro e na internet, ele, enfim, fez o país rir na TV aberta com um especial de “220 Volts”, na Globo, reprisado após a final do BBB 21 no lugar do “Profissão Repórter”. Paulo Gustavo era considerado um caso raro de sucesso em todas as mídias e é dele o recorde do filme que mais faturou em bilheterias no cinema nacional: “Minha Mãe é uma Peça 3”, que levou mais de 11,5 milhões de espectadores às salas do país e rendeu mais de R$ 180 milhões.
O número total da trilogia é ainda mais impressionante: a franquia vendeu mais de 25 milhões de ingressos e estava prestes a virar série de TV. Não foi à toa que marcas famosas e até um banco contrataram um homem vestido de mulher para expor seus produtos em propagandas. Se Dona Hermínina representa a mãe brasileira, parece seguro dizer que a comédia nacional ficou órfã sem Paulo Gustavo. Em entrevista ao programa “Conversa com Bial”, da Globo, Paulo Gustavo afirmou: “Não tem como arrastar quase 12 milhões aos cinemas e não ter evangélico, católico, pobre, rico. Meu grande orgulho é tocar o coração de todo tipo de gente”. O presidente da República, Jair Bolsonaro, manifestou condolências pela morte de Paulo Gustavo. Numa declaração ao site IG, o humorista comentou sobre o sucesso que vinha fazendo: “Eu estou muito feliz e não só pelos números, mas por ter levado tanta gente para assistir a uma história tão linda de amor, tolerância e inclusão”.
Foram diversos projetos para o cinema com “Vai que Cola”, “Minha Mãe é uma Peça”, “Os Homens são de Marte” e “Minha Vida em Marte”, além de muitas noites de teatro com “Hiperativo” e outros espetáculos. Independentemente do formato, o ator trabalhava muito em quase todo lugar, menos na TV aberta. A Globo foi dar a ele o merecido espaço em dezembro de 2020 com um tardio especial de fim de ano para “220 Volts”: era um teste para um possível programa solo que, agora, ele nunca terá. Na época, falou sobre o orgulho do programa e também sobre o receio de se contaminar com o coronavírus durante as gravações. “Ficamos com medo de gravar por causa da pandemia. Parecia que estávamos em uma sala de cirurgia no Projac, de tantos protocolos. Dava medo de pegar coronavírus, mas foi legal. A energia da gravação foi o máximo”, comemorou, em entrevista à “Folha de São Paulo”. A contaminação, no entanto, aconteceu meses depois.
Na TV fechada, por outro lado, o rosto de Paulo Gustavo aparecia tanto que é curioso pensar que ele tinha vergonha de ir a programas de televisão. Não gostava de dar entrevistas e afirmava que se sentia desconfortável como convidado de qualquer atração. Esse sentimento ele descrevia como um “semipânico” mas tudo mudava quando estava trabalhando com um roteiro escrito por ele próprio. O nome de Paulo Gustavo já era conhecido no humor desde 2004, quando participou do espetáculo “Surto”, mas foi com uma homenagem bem-humorada à própria mãe, Déa Lúcia, que o comediante se tornou lendário. Inspirado pelo jeitinho desbocado da mãe, ele deu à luz Dona Hermínia e mostrou ao mundo como enxergava a grande heroína da sua vida. Os monólogos de Dona Hermínia em “Minha Mãe é uma Peça” nasceram no teatro, em 2006, mas ultrapassaram os limites dos palcos e chegaram aos cinemas em 2013.