Nonato Guedes
O economista paraibano Maílson da Nóbrega, que foi ministro da Fazenda no governo de José Sarney, considera “falaciosa” a tentativa de regulamentação do Imposto sobre grandes fortunas (IGF), que, segundo ele, despertou interesse redobrado na conjuntura atual por causa dos efeitos econômicos e sociais provocados pela crise sanitária decorrente da Covid-19. Frisou que o Imposto costuma encantar muitos segmentos pelo fato de alcançar as parcelas mais favorecidas da sociedade e ser percebido como agente de justiça social. Mas, na prática, a seu ver, a proposta tem cunho demagógico. “Os custos do IGF superam seus supostos benefícios”, detona Maílson em seu blog na revista “Veja”.
Lembra o economista que o IGF está previsto na Constituição de 1988 mas, até hoje, não está regulamentado. “Felizmente”, pondera, justificando: “A experiência mostra que essa contribuição é difícil de administrar e gera pouca receita”. Textualmente, pontua Maílson: “Há quem defenda a instituição do IGF para financiar uma ampliação do Estado de bem-estar no Brasil. Trata-se de ideia cujos primórdios remontam à Alemanha do século XIX, quando o chanceler Otto von Bismarck (1815-1898) desenvolveu a primeira versão do programa com base na tradição de ações sociais da Prússia e da Saxônia. A proposta se consolidou entre a Grande Depressão dos anos 1930 e o pós-guerra. No Reino Unido, que construiu um dos mais conhecidos desses empreendimentos, sua origem foi o Relatório Beveridge (1942), que propunha a proteção social “do berço ao túmulo”, mediante contribuições dos trabalhadores”.
Mais tarde, em todo o mundo – acrescenta Maílson – os recursos viriam a ser complementados por aumento da carga tributária, particularmente sobre os mais ricos. Em alguns países, a alíquota máxima do imposto de renda chegou a 90%, o que desestimulava a poupança e o investimento, conspirando contra o desenvolvimento. A reação veio nos anos 1980, liderada por administrações conservadoras que reduziram as alíquotas a níveis razoáveis”. De acordo com Nóbrega, os equívocos do IGF foram realçados por três dos melhores especialistas em tributação no Brasil: Everardo Maciel, Cristiano Carvalho e Isaís Coelho, os quais mostraram os defeitos e as inconveniências do imposto. “Coelho, que amealhou invejável conhecimento de tributação como estudioso, fiscal de tributos federais e chefe da divisão de política tributária do FMI, realizou estudo comparativo sobre o IGF. Disse: “Não é por estar na Constituição de 1988 que o IGF é um bom imposto. Trata-se de incidência complexa, difícil e cara para administrar”.
O ex-ministro ainda agora entende que o Imposto cria desincentivos à atividade econômica e cita que, na Holanda, 26,4% das receitas eram gastas para arrecadá-lo, contra 4,8%, no caso do imposto de renda. Didaticamente, Maílson informa: “Grandes fortunas são o acúmulo de rendas auferidas ao longo da vida, de herança ou de doação. Em tais situações, tudo foi tributado mediante impostos de renda ou de transmissão de bens imóveis. Assim, criar uma incidência sobre essa riqueza constituiria bitributação. Mesmo assim, o IGF preserva o seu encanto”. O estudo de Coelho, nota Maílson, mostra que o IGF foi criado e extinto em vários países, como Alemanha, Áustria, Dinamarca, França, Espanha, Grécia, Holanda, Índia, Irlanda, Islândia, Itália, Suécia, Tailândia e outros. “Dada sua baixa produtividade, tem provocado fracassos um atrás do outro. Isso poderia justificar, ele sugere, esforços para realizar uma autópsia que explicasse por que tantos países o abandonaram. Mesmo assim, no Brasil, é incrível como ele ainda desperta a simpatia dos que não enxergam seus inúmeros defeitos”, conclui Maílson da Nóbrega.