Nonato Guedes
O prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo (PV), que está no segundo mandato, nunca foi conhecido como um político que gosta de blefar. Daí porque ele aparenta segurança na condução do processo da sua sucessão, por mais insistentes que sejam as versões de adversários de que seu esquema não conta com nomes carismáticos, de forte densidade nas urnas. No íntimo, Cartaxo dá a entender que confia piamente na repercussão da sua administração marcada por obras e serviços relevantes e no efeito colateral que essa repercussão terá no pleito. Ou seja: ele aposta na transferência de votos, por osmose, para o nome que indicar para dar continuidade a um projeto do qual se envaidece e que é bem aprovado, segundo pesquisas em seu poder. Ao fazer essa aposta, o alcaide sinaliza que o eleitorado está mais consciente e, portanto, com maior capacidade de discernimento para votar em quem tenha identidade com suas aspirações.
Supõe-se que o prefeito trabalhe com as chamadas pesquisas “quali” e “quanti” – as primeiras, fornecedoras de cenários subjetivos, mas nem por isso desimportantes para a avaliação de tendências da opinião pública, as segundas baseadas na expressão numérica que baliza o grau de aceitação ou reprovação de um modelo administrativo. Esse panorama, em tese, torna Cartaxo detentor privilegiado de informações que por enquanto são utilizadas estritamente para consumo interno, para análise dele com seus emissários de confiança, revolvendo cenários distintos contra adversários presumíveis ou já definidos. Eventual divulgação de percentuais de intenções de voto em opções sugeridas somente será feita na campanha propriamente dita, como parte da estratégia para criar ambiente psicológico favorável e, na sequência, irreversível aos planos do esquema capitaneado por Luciano.
Há alguns fatores que precisam ser levados em consideração no exame do quadro pré-eleitoral em João Pessoa. Um deles: a aliança firmada em 2018 para as eleições ao governo do Estado, em que o irmão gêmeo do prefeito, Lucélio Cartaxo, foi candidato e ficou em segundo lugar, não necessariamente terá que ser reproduzida na íntegra nas eleições municipais de 2020. Além da circunstância de que cada pleito é um pleito, com suas peculiaridades, é natural que partidos intentem lançar candidaturas próprias a prefeitos e vereadores para se fortalecer com vistas a embates mais significativos como o de governo do Estado. É nesse contexto que se justifica a insistência do deputado Ruy Carneiro em ser candidato próprio pelo PSDB, o que retiraria os tucanos do arco da aliança com Cartaxo. O mesmo vale para o PP do vereador Durval Ferreira, que planeja também entrar no páreo, e para o vice-prefeito Manoel Júnior, que faz uma incursão através do Solidariedade.
Esses partidos poderão convergir novamente em torno da liderança do “clã” Cartaxo, mas de saída estão liberados para tomar o rumo que lhes aprouver, no interesse da própria sobrevivência e da tática de ocupação de espaços, aspecto que é levado em conta por parcelas do eleitorado para as quais time que não joga não tem condição de crescer. O desenrolar da própria campanha sinalizará a perspectiva ou não de mutações nos cenários apregoados preliminarmente. Independente disso, o esquema Cartaxo tem sua própria estrutura – ou, pelo menos, confia no próprio poderio para atravessar o Rubicão sem grandes reforços. O grande fator, porém, que parece animar o “clã” familiar do prefeitoé a cisão declarada entre o ex-governador Ricardo Coutinho (PSB) e o governador João Azevêdo (Cidadania), que, juntos, em 2018, liquidaram a fatura impiedosamente no primeiro turno. Hoje, não trocam nem bom-dia.
Ainda no rescaldo da cizânia entre ex e atual governador, subsiste a perspectiva de inelegibilidade do ex-governador Ricardo Coutinho para as próximas eleições municipais, uma vez que ele responde a acusações na Operação Calvário e cumpre medidas cautelares, entre elas o uso de tornozeleira eletrônica, o que não é um trunfo para propaganda de candidato que quer vencer eleições ancorado na imagem de quase santidade, além da devoção extremada ao povo, como tem sido o ritual vigente nas campanhas realizadas no Brasil há bastante tempo. Com Ricardo “baqueado” para levar à frente uma candidatura e sem que o PSB tenha opções de peso para substituí-lo, Cartaxo já teria uma preocupação a menos. Uma outra preocupação a menos será a dificuldade teórica de o esquema do governador João Azevêdo, que está começando do zero em termos de partido, ganhar terreno que lhe permita monopolizar o páreo na Capital do Estado.
Sinceridade? O “clã” Cartaxo aposta muito mais na inércia e no inferno astral dos adversários do que no seu poderio efetivo para ganhar a sucessão do prefeito. Como não há espaço vazio, sobretudo em política, vai que o nome ungido pelo alcaide decole nas urnas. Ainda que seja uma vitória de Pirro, o esquema de Luciano terá alcançado a vitória nas eleições municipais de outubro de 2020. É o que se desenha, a priori. Vale lembrar apenas que política é dinâmica. Olha-se para o céu, está de um jeito; olha-se novamente, está de outro. É ensinamento das raposas mineiras…