Nonato Guedes
O Cidadania, partido liderado na Paraíba pelo governador João Azevêdo (ex-PSB), já tomou posição, através do seu presidente nacional, Roberto Freire, pelo impeachment do presidente Jair Bolsonaro, em virtude das ameaças golpistas por ele proferidas em manifestações do Sete de Setembro, com ataques a instituições como o Supremo Tribunal Federal e afirmação de que desobedecerá ordens partidas de ministros daquela Corte. Roberto Freire, que considerou os discursos de Bolsonaro em Brasília e São Paulo “um festival de desequilíbrio, destempero e desqualificação”, aduziu que o mandatário “jamais esteve à altura do cargo que ocupa nem consegue compreender o significado dos valores democráticos que partilhamos com a nação”.
O governador paraibano, no próprio dia das falas de Bolsonaro, expressou-se em redes sociais na defesa do princípio da independência dos poderes, repudiando atos que contrariem a legalidade, mas evitou se referir diretamente a Bolsonaro, falando, de forma genérica, sobre a importância do princípio democrático no sistema republicano. Apesar da moderação do gestor, interlocutores que lhe são próximos ressaltam não haver dúvidas quanto à sintonia de pensamento e de atitudes da parte dele com as decisões que forem tomadas no plano nacional no campo da resistência democrática e do repúdio a atos de autoritarismo. Essas fontes lembram que Azevêdo é um dos alvos da hostilidade do Planalto por integrar o Consórcio Nordeste e por ter subscrito documentos com críticas ao próprio governo federal em episódios desfavoráveis aos interesses dos Estados. “É uma moderação com firmeza, que não deixa dúvidas sobre de que lado o governador está”, revela uma fonte paraibana. O Estado conta com um filho ilustre no ministério da Saúde, que tem sido solícito a demandas locais e, no geral, consegue encaminhar pleitos em outros ministérios, mas não é privilegiado por Bolsonaro.
No que diz respeito à posição do Cidadania, ela se insere no contexto da grande frente partidária que vai se formando, depois do Sete de Setembro, para dar partida ao processo de impeachment do presidente Jair Bolsonaro. O PSDB, que habitualmente demora a se decidir e é conhecido pela tendência de ficar em cima do muro, já sinaliza apoio a movimentos pró-impeachment e o PT, que tem se resguardado para não queimar a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, abriu o diálogo sobre a saída extrema que seria o impedimento do presidente da República, no bojo do agravamento da crise institucional e política, combinada com a crise econômica-social e, por fim, com a crise sanitária decorrente do enfrentamento que persiste à covid-19. Em nota, o presidente do Cidadania, Roberto Freire, conceitua:
– De um lado, está a lei. A lei é para todos e não nos cabe como cidadãos escolhermos quais delas vamos ou não respeitar. Do outro lado estão a subversão da ordem, a instabilidade política e social, a intolerância e o autoritarismo. Bolsonaro age para aprofundar a crise econômica e sanitária que já deixou quase 600 mil mortos, 15 milhões de desempregados, mais de 50% da população em situação de insegurança alimentar, inflação à beira do descontrole, crise hídrica e desconfiança internacional. O presidente está em fuga. Agride as autoridades porque não sabe nem tem condições de governar. Agride as instituições porque sabe os crimes que cometeu – antes e depois da Presidência – e que ainda pretende cometer por não aceitar as regras do jogo democrático. Age como um marginal, mas não está à margem da lei”. E mais: “A resposta tem de ser política. E ela começa pelo devido processo de impeachment”.
No Twitter, Roberto Freire comparou que a atual situação política de Jair Bolsonaro se parece com a de Fernando Collor de Mello e Dilma Rousseff antes de serem chutados do Palácio do Planalto. “Estamos nos aproximando de um clima igual ao das antevésperas dos impeachments de Collor e de Dilma: há uma aceleração no afastamento das bases de sustentação econômico-financeira de Bolsonaro. O Centrão não costuma contrariar tais bases”. Indagado se há tempo hábil e condições políticas para o impeachment de Bolsonaro, Freire, ex-deputado federal, afirmou: “Tempo sempre tem. O impeachment de Dilma demorou por conta das intervenções do STF na tramitação do processo. Neste momento, porém, o STF é o principal interessado no impeachment de Bolsonaro e não vai atrapalhar. Pode ser rápido. O que temos de fazer agora é agitar a necessidade de impeachment de Bolsonaro nas redes e nas ruas”.
O governador João Azevêdo tem demonstrado afinidade com a pré-candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2022. Ele chegou a pedir à direção nacional do Cidadania autorização para se compor com Lula e declarar apoio a ele, diante da perspectiva de que o seu partido não terá candidato próprio ao Planalto. A “permissão” foi concedida, conforme repassado a jornalistas. Na recente peregrinação de Lula pelo Nordeste, Azevêdo encontrou-se com o petista em Natal, Rio Grande do Norte, onde se realizava uma reunião de governadores do Consórcio Nordeste para debate de temas emergenciais ligados a problemas da região. Lula reiterou a João Azevêdo o compromisso de vir à Paraíba, ainda em setembro, e ouviu, da parte do gestor paraibano, convite para uma audiência no Palácio da Redenção. Em paralelo, Lula tem conversado com outros líderes políticos paraibanos, inclusive adversários de Azevêdo, como o ex-governador Ricardo Coutinho e o ex-prefeito de João Pessoa, Luciano Cartaxo.