Dono de uma fértil criatividade e mentor dos títulos das melhores capas da revista A Carta, o mais inovador projeto editorial levado a cabo na Paraíba a partir dos anos 80, Josélio Gondim era adepto obsessivo da concisão no jornalismo. Quando o Banco do Estado foi fechado, alvo de liquidação extrajudicial do Banco Central no governo Collor, Josélio sapecou o título de capa: Paraiban…Bum!!!. Estava dito tudo. Na seara política, rendeu bastante um desaguisado entre lideranças por conta da disputa ao governo em 1986, opondo José Carlos da Silva Júnior a Wilson Braga e Milton Cabral. Josélio era ouvinte privilegiado das versões, em forma de confidência, de cada um. E me mandava os copiões para a finalização do texto. O título, ele já havia sacramentado: Se Ele Falasse…. Ou, na sequência: Se Ele Também Falasse…. Todos falaram, ainda que preservando-se o off e ninguém desmentiu A Carta.
Essa recapitulação vem a propósito da atual conjuntura política reinante na Paraíba, que registra uma queda-de-braço entre o ex-governador Ricardo Coutinho e o governador João Azevêdo, no metro quadrado do PSB, Partido Socialista Brasileiro, ao qual ainda estão filiados, a despeito da estreiteza notória do espaço de convivência. Até agora, Ricardo mantém um silêncio tumular sobre o que de fato aconteceu a ponto de gerar a dissolução do diretório regional socialista e a destituição de Edvaldo Rosas da presidência. No círculo próximo a Ricardo, diz-se: Ah, se ele falasse… A crise no PSB surpreendeu não apenas a socialistas desavisados mas a segmentos políticos instalados em outros partidos, que estranharam a velocidade com que se deu a ruptura.
Afinal, João Azevêdo e Ricardo Coutinho trocaram juras de amor eterno não faz muito tempo em plena campanha eleitoral de 2018, que ungiu Azevêdo governador em primeiro turno, com o apoio decisivo, que não pode ser olvidado, do ex-governador e ex-prefeito de João Pessoa. É certo que as rusgas começaram a aparecer antes dos primeiros cem dias de gestão, provocadas segundo se especula pela decisão de Azevêdo de decretar intervenção nos contratos firmados na Era Ricardo com organizações sociais, tipo Cruz Vermelha, para a gestão pactuada de hospitais públicos como o de Trauma e Emergência Senador Humberto Lucena. O tempo fechou com a prisão da ex-secretária Livânia Farias, as exonerações de ex-secretários de Ricardo, citados em inquérito de uma operação chamada providencialmente de Calvário, que teve o sinete do Gaeco-MPPB e conexões de alta periculosidade para a sorte do erário público.
Depois disso, nada mais foi como antes. O racha rebentou nas hostes socialistas, antigos aliados passaram a olhar enviesados uns para os outros, as conspirações começaram a correr soltas nos bastidores. O partido cindiu-se literalmente. Está dividido entre os que são chamados de adoradores da caneta, alusão a políticos que não conseguem sobreviver sem os atos de nomeação de correligionários para cargos públicos e de exoneração de supostos adversários políticos, e os políticos idealistas, aqueles que supostamente possuem um imenso espírito público e se preocupam, deveras, com a governabilidade e o interesse público, não com benesses ou mordomias que o pudê proporciona.
Como desgraça pouca é bobagem, o contencioso ganhou recentemente mais um ingrediente para piorar a situação: o evento S.O.S. Transposição, realizado em Monteiro, no cariri, sob a batuta de Ricardo Coutinho, com o reforço indispensável de petistas que buscam um lugar ao sol nesses tempos de estiagem, com prisão de Lula e impeachment de Dilma. João Azevêdo não compareceu ao evento. Tinha concepção diferente da do antecessor sobre a luta pela continuidade do projeto de transposição de águas do rio São Francisco. Ricardo dirigiu estocadas a João. Subliminares, mas contundentes. Foi como jogar mais uma pedra no meio do caminho da convivência com o sucessor, que, pelo visto, tornou-se um calvário para Coutinho.
A respeito do arranca-rabo nas hostes do Partido Socialista Brasileiro, ninguém se arrisca a fazer vaticínios sobre o que pode acontecer. Especula-se muito: quem vai sair da sigla, quem comandará de fato o partido na Paraíba, quem atrai mais líderes e aliados nas fileiras do PSB, qual o desenho da correlação de forças que vai emergir da solução do imbróglio. Como se vê, há muitas perguntas a serem respondidas, como há muito o que Ricardo tem a dizer e a explicar aos paraibanos sobre o desaguisado no antigo arraial dos girassóis. Se ele falasse, hein?
Nonato Guedes