No próximo ano, o Brasil volta às urnas para escolher presidente, governadores, senadores e deputados. O rito democrático se repete, mas a pergunta central permanece incômoda: até quando o eleitor seguirá concedendo novas chances aos mesmos personagens que demonstram completo descompromisso com os interesses nacionais?
É difícil justificar a ideia de que o voto deva ser um ato de indulgência permanente. Não existe obrigação moral ou cívica de reconduzir ao poder representantes que ignoram demandas sociais, fragilizam as instituições e tratam o mandato como um instrumento de benefício próprio. Ainda assim, o Congresso Nacional segue abrigando figuras cuja atuação pouco dialoga com o bem comum, protegidas por estruturas que parecem funcionar mais para garantir privilégios do que para assegurar justiça.
O contraste com a realidade do trabalhador brasileiro é gritante. Enquanto cidadãos comuns são demitidos, punidos ou criminalizados por infrações muito menores, vemos parlamentares condenados pela Justiça fugirem do país e, mesmo assim, continuarem recebendo salários normalmente. Essa distorção não é apenas jurídica — é ética. Ela mina a confiança nas instituições e reforça a sensação de que há dois pesos e duas medidas no país.
Mais grave ainda é o uso oportunista da religião como ferramenta de manipulação eleitoral. Ao instrumentalizar a fé e a boa-fé de milhões de brasileiros, certos políticos não apenas desrespeitam o eleitor, mas também esvaziam o debate público, substituindo propostas e responsabilidade por discursos morais seletivos e convenientes.
Diante desse cenário, a pergunta que precisa ser feita não é apenas em quem votar, mas como votar. O voto não é favor, nem herança, nem torcida organizada. É um instrumento de cobrança, de ruptura e de responsabilidade. Valorizar o próprio voto significa pesquisar, questionar, comparar trajetórias e, sobretudo, ter coragem de dizer não a quem já demonstrou não merecer confiança.
Talvez o verdadeiro “basta” não venha de discursos inflamados, mas de uma mudança concreta de postura do eleitor. Enquanto o voto for tratado como hábito ou resignação, a política continuará sendo território fértil para oportunistas. A democracia só amadurece quando o eleitor entende que seu voto não é um cheque em branco, é um contrato que pode e deve ser rompido.
