A nossa mídia cobre mal o Judiciário. E essa deficiência não decorre de má-fé, mas principalmente da falta de conhecimento técnico sobre o funcionamento do sistema de Justiça.
Quando um caso polêmico ganha atenção pública, a imprensa naturalmente busca acompanhá-lo. Mas sem compreender conceitos básicos, como segredo de Justiça, fases processuais, tipos de prisão ou fundamentos legais. O caso do influenciador Hytalo Santos é um exemplo emblemático. Ele está preso preventivamente, em um processo que tramita sob segredo de Justiça por envolver menores.
Recentemente, um juiz se averbou suspeito e deixou o caso. A imprensa local tratou o fato como algo alarmante, exigindo explicações públicas, como se se tratasse de uma ruptura institucional. Mas qualquer profissional que acompanha o cotidiano da magistratura sabe: suspeição e impedimento são previstos em lei e fazem parte do funcionamento regular da Justiça. São mecanismos que garantem imparcialidade, não sinais de crise.
O episódio ficou ainda mais curioso quando a repercussão local chamou atenção da mídia nacional, que rapidamente buscou confirmar a “notícia”. Isso levanta uma reflexão incômoda: até que ponto a troca de um juiz, um ato comum e normatizado, deve ser tratada como fato jornalístico de grande impacto? Ou será que o problema está na falta de intimidade da imprensa com a rotina do Judiciário?
O que se evidencia, afinal, é um distanciamento entre jornalistas e o sistema de Justiça. Grande parte dos profissionais não acompanha o dia a dia dos tribunais, não domina conceitos fundamentais do Direito e, por isso, tende a superdimensionar situações simples e a subestimar questões realmente relevantes. O resultado é uma cobertura que gera ruídos, alimenta interpretações equivocadas e pouco contribui para a compreensão pública do funcionamento das instituições.
Não se trata de culpar a imprensa, mas de reconhecer um déficit formativo que impacta diretamente a qualidade da democracia. O Judiciário é complexo, técnico, repleto de ritos e nuances. A sociedade depende da imprensa para traduzi-lo. E, enquanto esse elo não se fortalecer, continuaremos assistindo a análises distorcidas, polêmicas desnecessárias e uma compreensão frágil sobre temas que exigem precisão.
