A novela da pré-candidatura de Flávio Bolsonaro durou pouco, mas foi suficiente para expor uma verdade que o bolsonarismo insiste em esconder: o movimento está desorientado. E mais — o clã teme perder o protagonismo dentro de um campo político que já não aceita mais decisões impostas de cima para baixo.
A tentativa de lançar Flávio como herdeiro natural da candidatura presidencial de 2026 foi um gesto simbólico de Jair Bolsonaro, ainda tentando demonstrar força a partir da prisão. Mas o gesto saiu pela culatra.
A base não comprou.
O mercado rejeitou.
E Tarcísio, de longe, viu a confusão se desenrolar sem abrir a boca.
Quando Flávio apareceu, após visitar o pai preso, dizendo que Jair o havia escolhido para disputar a Presidência, a mensagem veio com o velho carimbo: “Se o chefe mandou, tá mandado”.
Mas 2026 não é 2018 — e ficou claro.
A repercussão foi tão negativa que pareceu que ninguém, além dos bolsonaristas mais fiéis, viu coerência no gesto. A ala ideológica até abraçou o nome, por puro instinto de lealdade. Mas a direita pragmática — aquela que quer ganhar eleição, não fazer homenagem — foi direta: Flávio não é viável.
E a reação do mercado mostrou que o problema não era só de narrativa. O anúncio derrubou a Bolsa. Um sinal típico de que não se trata apenas de disputa eleitoral, mas de credibilidade e confiança.
Pressionado por todos os lados, Flávio tratou de recuar. Disse que “pode não levar a candidatura até o fim”, tentou suavizar a própria exposição e, de quebra, elogiou Tarcísio de Freitas como “o principal cara do nosso time”.
Na prática, traduziu-se em: “Testamos, não deu certo, vamos fingir que não foi bem assim”.
Esse movimento revela que:
1. Flávio sabe que não tem lastro eleitoral suficiente.
2. A direita econômica não aceita improvisação.
3. O bolsonarismo está inseguro sobre seu futuro sem Jair no comando.
A ideia de que o clã poderia simplesmente apontar o dedo e definir o candidato mostrou-se ultrapassada. A base mudou, o cenário mudou e o bolsonarismo já não reina sozinho nem dentro da própria direita.
A sombra de Tarcísio
Tarcísio de Freitas tornou-se o centro dessa discussão não por se impor, mas por ser o único nome competitivo capaz de unir diferentes alas da direita. É o preferido da Faria Lima, agrada militares, não desperta rejeição tão intensa no centro e carrega a aura de “gestor profissional”.
Enquanto isso, os Bolsonaro enfrentam um dilema: quanto mais empurram Flávio, mais fortalecem a percepção de que Tarcísio é a opção sensata.
E quanto mais Tarcísio parece sensato, mais o bolsonarismo raiz torce o nariz, com medo de perder protagonismo para um nome menos ideológico.
Sem Jair Bolsonaro livre e ativo para liderar o processo, o movimento perdeu sua bússola. O lançamento de Flávio foi um teste de autoridade — e falhou.
A pergunta que fica é: quem manda no bolsonarismo agora?
Se a resposta não é mais “Jair”, o grupo tem um problema.
Se a resposta é “ninguém”, tem um problema ainda maior.
O que os últimos dias mostraram é que:
O bolsonarismo não tem sucessor claro.
O clã perdeu parte do poder de comando.
A direita está fragmentada e impaciente.
E Tarcísio precisa decidir se vai assumir o risco de ser a alternativa — ou se continuará evitando o abraço apertado do bolsonarismo.
