A união de dez centrais sindicais numa manifestação de protesto em São Paulo contra a conjuntura de 13 milhões de desempregados no país e a proposta de reforma da Previdência do governo do presidente Jair Bolsonaro foi um sintoma auspicioso da rearticulação de um segmento importante que nos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff congelou suas pautas reivindicatórias e sua mobilização, ora porque em parte foi cooptado pela Era PT, ora porque esse segmento embarcou na falácia de que as gestões petistas eram defensoras dos trabalhadores e, portanto, aliadas. A rearticulação de agora se dá à margem de uma interferência maior de lideranças petistas, que apenas tentam pegar carona na onda de impopularidade do governo Bolsonaro. Este, por sua vez, ficou de mãos vazias, sem ter nada a oferecer ao trabalhador no seu dia, registrando-se, aí, um momento melancólico mas ao mesmo tempo emblemático do que é o novo acenado por Bolsonaro.
A mobilização do primeiro de maio em São Paulo, berço de recentes e memoráveis lutas sindicais que projetaram no Brasil e no exterior a figura e a liderança emergente de Luiz Inácio Lula da Silva, atualmente recolhido a uma cela da Polícia Federal sob acusação de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, foi uma espécie de ensaio para a greve geral que está sendo costurada para o mês de junho. O mote aglutinador da greve geral será a necessidade de barrar a proposta da nova Previdência, em cuja confecção o governo de Bolsonaro está mergulhado em contradições e indefinições, além de conviver com pressões constantes de parlamentares da própria base aliada no Congresso Nacional e repúdio de representantes da sociedade que não assimilam modificações sugeridas ou discutidas embrionariamente.
O único consenso que parece subsistir no âmbito da sociedade diz respeito à necessidade da reforma da Previdência, já executada com êxito em vários países. Fora daí, há uma balbúrdia generalizada em face do formato que no Brasil a reforma pode vir a tomar. Entidades de classe dos trabalhadores identificam pontos de retrocesso nos avanços que têm sido acumulados pela sociedade nas últimas décadas no Brasil à custa de mobilizações populares. O presidente Bolsonaro, ainda anteontem, numa entrevista ao apresentador José Luiz Datena, na TV Band, procurou ser dramático na elucubração de que o rombo da Previdência é responsável pelas graves mazelas sociais com que o país se depara e que só a reforma concebida por ele e seus colaboradores seria capaz de estancar a sangria e criar um novo pacto social focado no progresso, no desenvolvimento. A discrepância de grande parte da sociedade em relação a Bolsonaro está no feitio que terá a nova Previdência, ameaçada de virar um Frankenstein pronto para assustar as diferentes categorias sociais.
O governo de Bolsonaro tem se comunicado pessimamente com a sociedade em diferentes instâncias. Toma medidas autoritárias, desmontando ou esvaziando setores essenciais como a Educação e não faz o indispensável diálogo com a sociedade para viabilizar o contraponto, que é da essência da democracia. Quer empurrar mudanças goela abaixo do cidadão comum na base do grito, da imposição, embora encha a boca para falar em democracia e cidadania. É uma gestão que não tem um plano claro, concreto, de fácil absorção pela sociedade como um todo. Por outro lado, o relacionamento com o Congresso Nacional tem sido turbulento. Bolsonaro, que governa preferencialmente pelo Twitter, em mão única, sem permitir a contestação ou até mesmo o feedback por parte dos grupos sociais, tentou encurralar o Congresso perante a opinião pública, insinuando que ali as coisas só caminham na base do fisiologismo e avisando que o seu governo não está disposto a ceder aa práticas conhecidas como a do toma lá, dá cá.
Como as negociações em torno da nova Previdência empacaram, apesar de que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tem imprimido a celeridade que se exige para a tramitação do projeto em comissões da Casa, o presidente Bolsonaro recorreu à tática de culpar os outros pelos erros de comunicação e de produção de boas matérias por parte do seu governo. Trata-se de estratégia diversionista, utilizada por diferentes governos quando chegam no ponto em que não conseguem governar por Medida Provisória ou de forma ditatorial, como adoram fazer. Tanto o artifício é manjado como a sociedade é cada vez mais exigente.
Nonato Guedes